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Bahia registra mais de mil homicĂ­dios dolosos no primeiro trimestre de 2025; estado lidera ranking nacional

Publicada em: 29/04/2025 06:46 - Bahia

Railan Andrade Santos e VitĂłria Gabriele Costa Cruz foram mortos enquanto esperavam uma pizza na Baixa de Quintas CrĂ©dito: Reprodução

 

Caique Costa, VitĂłria Gabriele Cruz e Railan Santos esperavam uma pizza quando foram vĂ­timas de um triplo homicĂ­dio na Baixa de Quintas, em janeiro deste ano. Os amigos, de 15 e 18 anos, foram alvo de 50 tiros disparados por um grupo de homens armados. Ă€ Ă©poca, a suspeita era de que a execução tivesse sido uma espĂ©cie de ‘recado’ por parte de traficantes. Um lastro de violĂȘncia que se estende ao longo do primeiro trimestre de 2025. Segundo dados do Sistema Nacional de InformaçÔes de Segurança PĂșblica (Sinesp), ligado ao MinistĂ©rio da Justiça e Segurança PĂșblica, a Bahia somou um total de 1.018 homicĂ­dios dolosos atĂ© março, sendo o estado nĂșmero 1 em mortes no Brasil neste ano.

 

Na pesquisa, considera-se como homicídio doloso a morte com indício de crime ou agressão externa, excluindo feminicídios, lesão corporal seguida de morte, latrocínios e mortes culposas. Também entram na classificação mortes violentas em acidentes de trùnsito quando hå dolo e casos como encontro de cadåveres ou ossadas com sinais de crime ou causas desconhecidas. Na Bahia, homens são a maioria das vítimas, somando 943 mortes, enquanto as mulheres correspondem a 74 casos. Por dia, são cerca de 11 homicídios, sendo a maior parte deles registrada na capital (208 homicídios) e na região metropolitana.

 

A estatĂ­stica nĂŁo Ă© novidade: desde 2015, a Bahia ocupa o primeiro lugar em homicĂ­dios dolosos no Brasil, segundo a base de dados do Sinesp. Um cenĂĄrio que, de acordo com o advogado Wagner Moreira, fundador e coordenador-geral do Ideas Assessoria Popular, reflete um fracasso da gestĂŁo dos partidos de centro-esquerda na ĂĄrea da segurança pĂșblica.

 

“A gente vem falando de um fenĂŽmeno que Ă© a nordestinização da violĂȘncia. Um cenĂĄrio em que, mesmo governos tidos como de esquerda ou centro-esquerda, nĂŁo conseguem reverter. Muito pelo contrĂĄrio, assumiram a liderança da violĂȘncia. Assim, encontramos estados do Nordeste com esse cenĂĄrio de hiperletalidade”, destaca, ao comparar o segundo e terceiro colocados no ranking de homicĂ­dios dolosos em 2025: Pernambuco, com 784 mortes, e CearĂĄ, com 714.

 

As dificuldades estendem-se ainda Ă  falta de diĂĄlogo com setores da sociedade civil, Ă  criminalização dos movimentos sociais e ao fracasso na lĂłgica de controle externo da atividade policial, acrescenta o advogado: “VocĂȘ vem cada vez mais aumentando, na lĂłgica deles, o combate Ă  criminalidade faccionada sĂł pelo confronto, sem ação de inteligĂȘncia, sem investir em investigação. EntĂŁo, todo esse cenĂĄrio joga para que a Bahia precise, de fato, revisar os rumos da segurança pĂșblica.”

 

O historiador e integrante da Rede de ObservatĂłrios da Segurança na Bahia Dudu Ribeiro aponta a influĂȘncia do trĂĄfico de drogas no nĂșmero de homicĂ­dios no estado, seja nas disputas territoriais ou nos confrontos com a polĂ­cia. Outro fator citado Ă© a polĂ­tica de encarceramento em massa, que fortaleceria a atuação de facçÔes criminosas.

 

"É importante que a gente perceba que um conjunto muito mais amplo de pessoas Ă© atingido pela violĂȘncia urbana. Estamos falando de crianças que crescem sem os seus pais assassinados e de mulheres negras que ficam sobrecarregadas em suas tarefas. Estamos falando tambĂ©m de um custo relacionado Ă  convivĂȘncia cotidiana das periferias do Brasil com o luto, que adoece e impede possibilidades de vida”, explica.

 

Ribeiro tambĂ©m ressalta a importĂąncia de qualificar a produção dos dados de segurança pĂșblica a nĂ­vel nacional, visando a criação de estratĂ©gias alinhadas em todo o paĂ­s. Ainda assim, Ă© importante repensar a lĂłgica atual do combate ao crime, passando a priorizar a proteção das pessoas ao invĂ©s da letalidade.

 

“NĂŁo adianta uma estratĂ©gia que promova mais guerra. Temos que pensar em um alinhamento nacional na ĂĄrea de segurança pĂșblica baseado na proteção da vida e na desorganização dos grupos criminais a partir da inteligĂȘncia. Isso pode ser feito a partir do investimento em ciĂȘncia, em tecnologia e no treinamento, alĂ©m da redução do papel do militarismo na vida dos brasileiros, que Ă© o grande responsĂĄvel pela manutenção desse aparato de violĂȘncia”.

 

Procurada pela reportagem, a Secretaria de Segurança PĂșblica da Bahia (SSP-BA) declarou que as açÔes das PolĂ­cias Militar e Civil resultaram em reduçÔes de 12,6% (em Salvador) e de 15,7% (na RegiĂŁo Metropolitana de Salvador) das mortes violentas, entre janeiro e abril de 2025, em comparação com o mesmo perĂ­odo do ano anterior. No estado, a queda Ă© de 10,4%. Acrescentaram ainda que, nos Ășltimos dois anos, as mortes violentas recuaram 8,2% (em 2024) e 6% (em 2023) na Bahia.

 

Comparando os primeiros trimestres de 2024 e 2025, a redução no nĂșmero de homicĂ­dios dolosos foi de 118 casos. “Ainda que a gente tenha uma tendĂȘncia de queda, essa queda nĂŁo Ă© suficiente, a Bahia permanece no topo do ranking da letalidade”, contesta Moreira.

 

Entretanto, ele destaca que o estado começa a dar sinais de que reconhece o fracasso da sua polĂ­tica de segurança pĂșblica. Moreira aponta como exemplo a troca recente dos postos de comando abaixo do secretĂĄrio de Segurança, incluindo o comandante-geral da PolĂ­cia Militar, o chefe do Corpo de Bombeiros e a delegada-geral da PolĂ­cia Civil. Salienta ainda que parte dessas mudanças seguiu pautada pela pressĂŁo social apĂłs casos de grande repercussĂŁo, como a chacina da Gamboa, em 2022, e a morte da lĂ­der quilombola MĂŁe Bernadette, em 2023. “Quando vocĂȘ empresta a biografia a esses dados, percebe a gravidade deles”, conclui.

*Com colaboração do repórter Gilberto Barbosa

 

Por Correio24horas

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